Com barro, sangue e um panfleto de liquidação sobre as fuças, estava debruçado o desconhecido, em frente ao boteco do Mané Preto, na esquina da rua oito com a principal.
A comunidade já estava acostumada ao barro e a outros diversos incidentes causados pelos problemas de escoamento. Inclusive, o próprio Mané Preto, por conta do alagamento que ocorrera dias antes desse despacho, tinha perdido a geladeira nova que lhe acumulara dívida para mais de um ano.
O tal presunto é que era coisa fresca na favela.
Naquela segunda-feira, "dia de branco" - como reza a oração da burguesia -, pouco demorou para que toda gente da vizinhança se achegasse ao desgraçado.
E a lotação, que costumava sair do bairro abarrotada de marmiteiros, pedreiros, engraxates, bicheiros, cafetões, putas, diaristas e catadores de cobre, alumínio e papelão, levou só meia dúzia de mercenários - daqueles que não estampam qualquer consideração pelo próximo - sem fé no principal mandamento do Nosso Senhor Jesus Cristinho.
A comunidade já estava acostumada ao barro e a outros diversos incidentes causados pelos problemas de escoamento. Inclusive, o próprio Mané Preto, por conta do alagamento que ocorrera dias antes desse despacho, tinha perdido a geladeira nova que lhe acumulara dívida para mais de um ano.
O tal presunto é que era coisa fresca na favela.
Naquela segunda-feira, "dia de branco" - como reza a oração da burguesia -, pouco demorou para que toda gente da vizinhança se achegasse ao desgraçado.
E a lotação, que costumava sair do bairro abarrotada de marmiteiros, pedreiros, engraxates, bicheiros, cafetões, putas, diaristas e catadores de cobre, alumínio e papelão, levou só meia dúzia de mercenários - daqueles que não estampam qualquer consideração pelo próximo - sem fé no principal mandamento do Nosso Senhor Jesus Cristinho.
A maioria, comovida e indignada, ficou para prestar homenagem de muita reza e lágrima.
As beatas se prontificaram rapidamente. Esfregavam compulsivas os seus terços ensebados por entre os dedos, rezando decorados Padre-Nossos e Ave-Marias; o mutirão acompanhava.
De frente para a reza, nas banquetas do boteco, homens bebiam o defunto pela conta do Mané Preto, e conversavam a vida, e matavam a vida.
Cada um dos presentes, tão desgraçado quanto o indigente, colaborava com o que podia. Afinal, até mesmo o tal, que imóvel e debruçado nada fazia, colaborara morrendo.
3 comentários:
A morte...
Coincidentemente ou não, hoje foi um dia no qual convivi com um pouco dela.
E, coincidentemnte ou não, eu comecei a formular hipóteses parecidas desse porquê de se viver, que é menos exato do que o porquê de se morrer.
Então eu leio você. Engraçado, Tato, não existem coincidências, apenas o inevitável em todas suas peripécias - na vida, na morte, na leitura ou na consolidação da expressão artístico-litearária do indivíduo.
Fico feliz por passar cada uma dessas ao seu lado, amigo meu.
Xô mandar-lhe uma pergunta:
qual sua relação com as "favelas"?
Eu dou aula, de noite, na periferia.
Tento não ser um mercenário,
mas não me importo
de ser tão indigente
quanto o Mané Preto.
Mais uma vez meu querido vc não minoriza a vida e sim o que excede dela, aquilo que soberja, vc faz o recorte literário, o âmbito do sentimento malandro e não o lugar do malandro, a conversa de malando identificada na categoria do ser, do intimo de ser, malandro.
Grande Clayton!
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